Não deveria ser deste modo
(giovannagiovanelli.blogspot.com)
Ela chegou assim sem avisar. Lembro-me de certa movimentação
nos bastidores da família, correria para um lado, para outro e nada de me
dizerem o que estava acontecendo. Eu chegava e era um tal de mudarem de
assunto, saírem para compromissos “inadiáveis”, até que não teve mais jeito e
abriram o jogo.
Confesso que não foi um dos momentos mais
agradáveis da minha vida. Todo um planejamento, até então seguido à risca, casa
feita na medida, aquele sonho de ir morar na praia depois da aposentadoria e de
repente as coisas poderiam mudar. Breve eu seria avô, pode isso?
Na
maternidade foi meu primeiro encontro com ela. Enquanto as avós procuravam semelhanças
com familiares, eu não conseguia perceber nada. Na verdade todo recém-nascido,
para mim, tem cara de joelho, são todos iguais. Mas já com cinco meses levei-a numa
reunião de professores na escola, com direito a sacola, mamadeira, roupinhas e
chupeta. Fui salvo por uma colega na hora de trocar a fralda.
Depois,
conforme foi crescendo, passou a ser minha companheira em todos os lugares que
eu ia. Supermercado, café com amigos, colônias de férias com a avó, clube,
restaurantes. Até no rancho fomos os
dois uma vez, quando ficamos dois dias pescando, cozinhando e brincando.
Duas
cenas não me saem da memória: ela pequena ainda e assistíamos ao filme do ET. Eu
ia comentando as cenas para que entendesse e, no final, quando ele (ET) se
despede da mãe do Eliot, olhei para ela e seus olhos estavam inundados de
lágrimas. A outra cena foi a expressão de felicidade em seu rosto, no seu
ultimo aniversário, quando combinei com o André que pegaria carona no seu
trenzinho que iria buscá-la na saída da escola, junto com seus colegas. Eu estava
vestido de palhaço com um saco de balas na mão.
Hoje
ela tem um ritual. Quando vai dormir exige que eu vá ao pé da escada, no degrau
certo, então me dá um abraço, um beijo e diz “boa noite”. Torço para que ela,
ao crescer, guarde estas recordações, assim como me lembro do meu avô Lordello cuidando
de seus pássaros cantadores, ou dos piões que fazia em sua pequena marcenaria.
Porém o problema é que os degraus da escada
estão acabando e eu não sei direito brincar de gente grande.
Sérgio
Lordello
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Bel