O discurso que não fiz
A
professora Andréa Bombonati faz um trabalho fantástico com seus alunos do
Cotil, dividindo as classes em grupos, fazendo-os pesquisarem sobre os gêneros
literários e cada equipe deve apresentar o resultado para todos os demais
colegas. No dia, a molecada tem que vir formalmente trajada, convidar um
padrinho para acompanhá-los e após receber as críticas e elogios dos
professores presentes. No final do ano passado fui convidado por um grupo para
apadrinhá-los no evento e por incrível coincidência o tema deles seria
“crônica”.
No
dia combinado, eles foram impecáveis na apresentação, aplaudidos, então fui convidado
para comentar e tecer palavras de incentivo à leitura, à escrita, tentando
sensibilizá-los sobre a importância de tais atos em suas vidas. Mas o idiota
aqui, num momento de pouca lucidez, de estupidez mesmo, fez um discurso como se
fosse um jogador de futebol dando entrevista no final de uma partida, ou seja, só
clichê, sem conteúdo, até do português me descuidei. Ou seja, não disse nada
sobre coisa nenhuma.
Depois,
muito chateado fiquei me remoendo por ter perdido uma oportunidade de ouro de
ter-lhes falado sob os efeitos que um texto faz (ou pode fazer) nas pessoas que
os lêem. Gostaria de ter-lhes contado que não precisam ser magníficos como os grandes
cronistas que citaram como exemplo, podem se espelhar neles sim, mas não
precisam ter a mesma sapiência, sagacidade, perspicácia, alegria, basta
escreverem com o coração, buscarem assuntos dentro de suas almas, praticarem a
empatia como forma de atingirem os seus leitores.
Gostaria
de ter-lhes falado que também alguém simples, muito distante daqueles ícones,
até com um português com muitas limitações, mesmo através de textos pouco
rebuscados também pode impressionar seus leitores, causar emoção com o tema ou
ainda comove-los com os personagens envolvidos. Gostaria de ter-lhes discorrido
que uma pessoa comum como eles, muito próxima a eles, com a qual tinham acesso
todos os dias, disponível nos corredores daquela escola a todo o momento,
escrevia textos no Jornal de Limeira quinzenalmente e obtivera vários
testemunhos dos efeitos que tais crônicas tinham causado as pessoas, que de
alguma forma lhes trouxeram recordações da infância, lembranças de familiares,
histórias parecidas com que estiveram envolvidos, fatos acontecidos com seus
times de futebol, ou mesmo as mentiras contadas num boteco que lhes traziam reminiscências.
Nenhuma delas enalteceu a qualidade dos textos, ou a construção das frases, ou apontou
os erros gramaticais ocorridos. Todos os que elogiaram se inseriram no texto de
alguma forma e mesmo os que criticaram o foi por divergências no campo das
idéias.
Gostaria
de ter-lhes dito que escrever é muito bom, expor as idéias é melhor ainda e nos
faz crescer, mas naquele dia as palavras driblaram a minha mente.
Sérgio Lordello
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