Somente para maiores de trinta anos
Porque
senão, os demais leitores, me chamarão de louco ou que escrevi o artigo numa
mesa do Bar do Toco. Os fatos que vou relatar fizeram parte dos nossos
cotidianos nos anos oitenta e noventa. Era simplesmente o nosso dia a dia, mas
os mais jovens nem imaginam pelo que passamos na época de inflação no país.
Quarto
dia útil de todo mês, tínhamos uma viagem marcada para Campinas, numa visita
necessária ao Carrefour para a compra doméstica mensal. Tínhamos um vale da
Unicamp que seria descontado no próximo pagamento e adquiríamos tudo o que
iriamos consumir no período. Não dava para ser em outro dia, pois os preços
poderiam subir. Não sabíamos os preços das coisas, pois o valor das mesmas variava
no mesmo dia. Para adquirirmos uma caixa de fósforos não tínhamos ideia de
quanto teríamos que desembolsar.
Era
uma batalha diária para tentar preservar o valor do nosso salário. Em 1993 a
inflação anual atingiu 2.477 % por exemplo. Conforme afirmou o ex-ministro
Maílson da Nóbrega na revista Veja desta semana: “se com 100 reais o consumidor
podia comprar 8 quilos de filé, mas trinta dias depois dava para comprar apenas
1 quilo de carne”.
Na
época havia uma aplicação conhecida como “Overnight”, onde você todo dia tinha
que ir ao banco para aplicar o seu saldo por uma noite, era preciso resgatar e
aplicar novamente. Qualquer dinheirinho que sobrasse trocávamos por dólar, todo
mundo comprava e quando era uma reserva para um negócio futuro, qualquer micro
empresário tinha uma gaveta particular no cofre do banco para guarda-los.
Na
loja da minha esposa, por conta de um Natal “mais gordo” em vendas e sabendo
que as compras de roupa de inverno necessitariam de um montante maior de
capital daqui a alguns meses, ela investiu essa sobra num veículo para venda
posterior. Era uma loucura e os menores de trinta anos nem imaginam como foi
sobreviver nesta época e o pior é que foi o período de maior concentração de
renda da história, pois os “ricos” tinham como proteger o seu dinheiro e os de
baixa renda tinham que fazer muitas artimanhas, verdadeiras acrobacias.
Tudo
isto acontecia porque os governos gastavam mais do que deviam, emitiam dinheiro
sem lastro e cometiam erros terríveis como os planos: Cruzado e Collor,
congelamento de preços e salários, resgate da poupança e etc. O plano Real, que
comemora 20 anos, trouxe o controle sobre a inflação, recuperação do poder
aquisitivo da população e colocou o país nos trilhos do desenvolvimento. É
preciso administrá-lo com seriedade, com a inflação dentro da meta e sem
truques nas finanças públicas.
Hoje
quando vou à Campinas com a família, é para programas muito mais interessantes
do que fazer compras para proteger o meu parco capital.
Sérgio Lordello
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