Parece que o trem já passou

(www.outraspalavras.net)


         Desde os tempos de criança fomos sempre  alertados que o nosso era o país do futuro, quantas esperanças depositadas nas palavras de nossos mestres sobre as nossas riquezas, nossa extensão territorial, a imensidão dos mares, a capacidade de criação de nosso povo. Um país de terras férteis, sol o ano inteiro,  água abundante. Líamos nos livros ou víamos nos filmes o desenvolvimento dos países do primeiro mundo e questionávamos sobre quando chegaria a nossa hora, quando a população poderia usufruir dessa grandeza anunciada.
         Mas nunca nos alertaram para cuidarmos com cuidado dos dois únicos perigos que poderiam impedir a chegada deste futuro: a classe política inadequada e a crise de valores morais e éticos. A primeira, tendo deixado crescer no seu seio um grupo de aproveitadores que, como o “mata-pau”, aquela árvore que cresce sobre as outras e vão estrangulando-as até a sua morte, foram estabelecendo regras corporativistas, privilégios fisiológicos, direitos próprios, formando uma casta onde as espécies legítimas e soberanas tornaram-se raras. Já a crise de valores morais e éticos é muito mais letal, pois, senão cuidada, alastra-se por todos os demais setores da sociedade condenando o país ao descanso eterno “em berço esplendido”.
         Os anos 2000 pareciam indicar a grande mudança deste país, algumas correções de rumo, uma conjuntura mundial favorável, um crescimento alicerçado em ações com responsabilidade, mostravam que era possível atingirmos nosso sonho. Mostramos ao mundo o peso da nossa agricultura, o valor das nossas riquezas minerais, a correção dos nossos rumos. Passamos incólumes por crises dos chamados ricos e daí, acreditamos estar invulneráveis. Ledo engano.
         No papel de novos ricos, passamos a gastar mais do que devíamos, financiamos obras em republiquetas vizinhas, valorizamos líderes com históricos opressores, imprimimos um ritmo inadequado no processo justo de distribuição de rendas e oportunidades sociais. Para mostrar a nossa grandeza inventamos assumir a organização de dois eventos mundiais: a Copa do Mundo e a Olímpiada, mas esquecemos de antes de mudar o código penal, o civil, a lei eleitoral e outras tantas para conter a sanha devoradora do patrimônio público de nossos dirigentes.
         Pior ainda foi alimentar o projeto de manutenção do poder a qualquer custo. Em seu nome tudo é permitido, tudo é possível. Pode-se, por exemplo, turbinar o déficit primário com a inclusão de receitas especiais (Estadão- 31/12/2013), desestruturar a Petrobrás, ou mesmo alardear aos quatro cantos que o julgamento do “Mensalão” foi 80% político num tribunal que constitui o terceiro poder da república, formado, em sua grande maioria por magistrados indicados por quem está no poder.
         Juros subindo, inflação em alta, vendas em baixa. É, parece que o trem realmente passou e não nos deixaram embarcar na estação.

Sérgio Lordello

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