Pão-duro não

(rejanemartinet.com.br)


         Existem pessoas, eu diria, que são seguras, mas não pães-duros. Entre estes últimos estaria aquele que o folclore da cidade estipula como o maior deles e assegura que é verdadeira a história do guarda-noturno que passando na frente da casa do dito-cujo, ficou intrigado com a luz da sala que apagava e acendia rapidamente, inúmeras vezes. Preocupado que fosse algum sinal de alerta, sacou a arma, bateu na porta e questionou-o, no que lhe foi explicado que ele lia o jornal e quando precisava virar a página, apagava a luz para economizar energia.
         Sei não se é verdade. No entanto existem pessoas seguras que tem o hábito de pagar o justo pelas coisas, não serem levadas pelo entusiasmo da situação, mas até que exageram um pouco. O Orlando, por exemplo, é um deles e quando íamos viajar nas férias de julho já o elegíamos como responsável pelo caixinha, já que nos restaurantes e bares em que íamos não havia nenhuma possibilidade do dono colocar um chopinho a mais que fosse, pois ele anotava todos os pedidos em detalhes. Acho até que foi ele quem criou as atuais “comandas” dos bares.
         O Marcelo é outro que para enfiar a mão no bolso é preciso muita coisa. Certa vez fizemos um churrasco da turma de casais na nossa chácara e fui encarregado de comprar tudo, levar as coisas, gelar, assar a carne. Divertimo-nos a noite toda e combinamos que todos passariam no meu escritório na segunda-feira, para acertarmos as contas. Logo cedo ele apareceu e quando lhe falei o valor, perguntou:
         - Mas você já descontou aquele pedaço de carne que sobrou?
         Já o Kleber, meu dentista, tem outro jeito muito mais discreto na sua forma de ser seguro. Para não haver problemas de calote com seus clientes, ele os dividiu em três grupos com as fichinhas dos mesmos (prontuários), colocando-as sobre a mesa. Em cima do primeiro montinho, dos “bons” pagadores, ele deposita uma imagem de Santo Agostinho, doutor e teólogo da igreja que criou o conceito da “salvação” e da “graça divina”. Já no segundo grupo ele coloca Santo Expedito, o “santo das causas urgentes”, talvez para apressar os seus recebimentos. Finalmente para o último grupo ele reserva a imagem de Santa Edwiges, “protetora dos pobres e dos endividados”. Com certeza para que eles consigam pagá-lo.
         Eu só não descobri ainda sob qual dos santos ele coloca a minha ficha.

Sergio Lordello
Professor

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