Quando tudo dá errado



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        As crianças já estavam naquela fase de dormir na casa das primas ou das coleguinhas. Também quem me dera, até então foi um período em que nos dedicamos totalmente a elas e nos esquecemos da vida de um casal, dos momentos que devem ser vividos a dois. Ainda bem que as duas já dormiam em seus quartos, mas qualquer barulho, gemido, ou tosse e saíamos correndo para ver o que estava acontecendo. Era uma dedicação em tempo integral, principalmente por parte dela.
         Aniversário de casamento se aproximando e resolvemos desfrutar aquela data como nos tempos de namorados, inteirinha para nós. Um jantar num restaurante e uma noite inédita num motel, até então algo proibido. Levamos as crianças para a casa de uma das tias e partimos para uma noite de deleite. Primeiro um jantar discreto, demorado, com juras sussurradas nos ouvidos, palavras de carinho, uma rosa talvez. Mas os garçons e o cozinheiro resolveram conspirar contra o clima, por conta de uma Festa do Peão que a Prefeitura realizava nas proximidades do restaurante. O prato foi o mais rápido já elaborado, as cadeiras já começavam a ficar de pernas para o ar, para facilitar a limpeza no outro dia.
         Naquela época ir a um motel representava a quebra de um paradigma. Era um assunto que só revelaríamos aos amigos mais íntimos e olhe lá. A curiosidade por saber o que lá encontrar era muito maior. A visão de uma cama redonda com luzes coloridas piscando à sua volta, lembrou-nos do filme “Contatos imediatos”, parecia uma nave alienígena pousando no quarto.
         Passado o susto e por conta de uma onda de pernilongos que invadira a cidade, levei e coloquei um aparelho repelente de insetos na tomada para assegurar uma noite “tranquila e reparadora”, como afirmava o fabricante. Depois de algum tempo aprendendo a dosar a iluminação, obviamente a mais discreta possível para enfrentar aquela infinidade de espelhos, após colocar um som adequado para o momento e saborear alguns goles de um bom vinho varietal, começamos a sentir um cheiro forte de queimado. Preocupados, corremos tentando descobrir a origem daquilo e percebemos que a tomada onde eu colocara o aparelho repelente era 220 volts e ele 110.
         Parece que os anjos estavam conspirando contra a nossa comemoração. Depois de expulsar a fumaça, abrir todas as janelas e vidros, avisar a portaria que estava tudo em ordem, voltamos a saborear o vinho e degustar o queijo que pedimos. Madrugada já, e o exército de pernilongos já mandava as suas esquadrilhas ao ataque. Era uma ofensiva severa e sem trégua. Imediatamente levantamo-nos, juntamos as coisas e voltamos para o aconchego do nosso lar. Finalmente conseguiríamos terminar a noite de forma “tranquila e reparadora”.
         Mal adormecemos e tocou o telefone. Era a Jacira, minha cunhada, toda preocupada e perguntando senão poderíamos levar a minha sogra ao hospital, pois ela não estava passando bem.
         Depois daquilo, já tentei inúmeras vezes tentar reeditar aquela comemoração, mas não há jeito de convencê-la.

Sérgio Lordello

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