Ainda há esperança



         Todos nós morávamos perto do São Benedito e logo de manhã caminhávamos em direção ao Grupo Flamínio, nossa escola, e sabíamos da rígida disciplina dela. Ao toque da sineta, antes das oito horas, cada turma se reunia no pátio para cantar o Hino Nacional, sempre sob as vistas severas do seo Otávio, nosso diretor. Com a mão direita sobre o coração, declamávamos toda a letra. Depois subíamos para as salas e à entrada do professor tínhamos que nos levantar do lado direito da carteira e saudá-lo.

         As professoras, donas Dinorah, Heloisa, Albina e Maria Thereza, tinham o total domínio da classe. Severas, elas exigiam seriedade de nós alunos, cobravam nossos afazeres e qualquer deslize poderia nos causar dupla penalização: primeiro por parte delas e depois dos nossos pais, que sempre davam razão ao professor. E, valha-me Deus, se fosse o diretor quem mandasse a “observação” então seria o caos. Teríamos que colocar um short por baixo da calça para amenizar a dor das chineladas ou apelar para os santos de plantão para que aquilo se transformasse apenas num castigo.

         Para nós, fazer o Tiro de Guerra era motivo de orgulho, estava nos nossos planos de vida, lá todos eram tratados de forma igual, aprendíamos disciplina, responsabilidade. No Cotil, professores como Gracioli, Mikami, na verdade a grande maioria deles, nos ensinou que prazos de entrega de trabalhos tinham que ser respeitados, mesmo que custasse o fim de semana em cima dos livros ou da prancheta. E quanto nós aprendemos a nos virar nas repúblicas, com comida ruim, roupa suja ou escolher entre o bom e o mau caminho.

         Hoje tudo é diferente. Falar as notas perante a classe é constranger o aluno. Chamar a atenção dele por alguma atitude desrespeitosa pode render uma advertência para nós. Peripécias são feitas pelos pais para livrarem os filhos de um dever cívico e as faltas cometidas em sala de aula agora é sempre por má influência do professor, um “incompetente”.

         Mas sábado a nossa esperança voltou. Fim da noite, estávamos saboreando um lanche no Bar do Toco e de repente um grupo de jovens (não adolescentes), passando pela rua, chutou o lixo de restaurante próximo, quebrando garrafas, espalhando tudo no meio da rua. Repentinamente passou uma viatura policial e o André logo indicou por onde tinham ido os vândalos. Em poucos minutos voltou a viatura com os mesmos e logo uma vizinha arranjou uma vassoura, outra cedeu uma pazinha, para a vibração do Gerinha, do Fernando, Balanga, Rizzo e dos outros que lá estavam.


Um dos jovens, já barbado, depois de limpar e arrumar a sua própria bagunça, ao devolver e “agradecer” o empréstimo da vassoura, questionou-nos se já não havíamos feito algo parecido, no que o Toco prontamente respondeu:

- Já fizemos sim, mas depois que a nossa barba cresceu passamos a fazer coisas mais inteligentes.



Sérgio Lordello

professor

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