Bons tempos aqueles...
Não sei se foi por causa do neto que nasceu recentemente, ou pelo susto que seu coração lhe pregou algum tempo atrás, mas hoje sabemos que estamos diante de uma versão “light” dele. Fico olhando os seus alunos se aproximarem, conversando, contando piada, até com algumas brincadeiras e fico pensando comigo mesmo: “Quem diria, o Marcão!”.
Na verdade ele tem quase um metro e noventa de altura, pouco mais de cem quilos, uma cara e uma postura de meter medo em qualquer aluno novato. Em sala de aula não era de muita conversa, sua voz grossa e um pouco ríspida, não dava muita margem para contestações. Compensava, porém, com seu bom conhecimento técnico, o planejamento de suas aulas e a imparcialidade de suas avaliações.
Em contrapartida, quando se tratava de confraternização entre os professores, nós dois éramos sempre escalados para cuidarmos de tudo. Quando o pessoal nos via juntos já previa que alguma festa estava para acontecer. Na verdade duas, pois sempre na véspera fazíamos a “preparação” onde desossávamos algum traseiro, picávamos as carnes e temperávamos as mesmas. E foi depois de uma delas que ele me telefonou, logo de manhã:
- “Sérgio, pelo amor de Deus, procure a minha aliança que perdi ontem lá na chácara do seu sogro. Falei para a Mônica que estava na pedra da talha.”
Mesmo sabendo que nem talha havia lá, fui sorrateiramente mais cedo para salvar o amigo. Depois de vasculhar por tudo quanto é canto, fui descobri-la mergulhada na tina com a carne temperada. E não é que durante o churrasco todos os colegas não paravam de elogiar o sabor do nosso tempero?
Outra dia, na sala dos professores, questionado por um colega novato sobre o motivo da licença médica de uma professora que acabara de adentrar, apenas falou que era maternidade e saiu apressadamente da sala. O professor levantou-se e cumprimentou-a pelo recém nascido sem saber que a mesma era uma daquelas solteironas convictas e juramentadas.
Agora, situação curiosa e desconfortável, foi quando ele descobriu um pequeno caroço no seu peito. O médico imediatamente recomendou-lhe fazer uma mamografia. Daí começou o seu dilema: como enfrentar todas aquelas mulheres na sala de espera. No dia marcado, acordou mais cedo, revirou o maleiro do seu quarto a procura de uma valise do tipo 007 e partiu para o malfadado exame. Esperando ser chamado, foi questionado por uma delas, sobre o motivo de sua presença num ambiente totalmente feminino e ele foi logo se safando:
- “A senhora não está vendo a minha maleta? Sou representante de um laboratório de remédios e vim visitar o doutor.”
Sérgio Lordello
professor
Comentários
Eu sempre acreditei que quando buscamos boas lembranças do passado nós as vivenciamos novamente e a leitura do seu texto foi gratificante.
Mas, se me permite caro amigo, tentarei mostrar em algumas linhas que o tempo também lhe deixou marcas...como pai solidário, avô amigo ou
professor dedicado e estudioso. Porem e, sempre tem o porem, quando eu me lembro das viagens de pescaria que fazíamos à
querida Paulicéia, nas barrancas do rio Paraná, lá na divisa do Mato Grosso e você nem vara de pescar tinha. Numa bela noite, após o término
das aulas, você me convida para irmos até o estacionamento e me mostra uma vara de pesca novinha:
- Comprei no Carrefour da ponte do Limão em São Paulo, diz orgulhoso. Sim, mas onde estão os anzóis, as linhas e as chumbadas?
Ora bolas, pra que, se você tem uma caixa cheia desses trecos?
Ainda em relação às nossas tentativas de pescar no rio Paraná me recordo do fato de ter ido à Praia Azul em Americana comprar
iscas vivas – tuviras; para que não morressem foram acondicionadas em bombonas com água fresca e aguapés, com o maior cuidado,
no intuito de resistires os 600 quilômetros de viagem. No primeiro dia de pescaria, quando retornávamos de barco, eu e o
saudoso professor Paulo Damir, de longe avistamos um tumulto generalizado no toboágua da Colônia de férias onde estávamos hospedados.
Chegando mais perto, boquiabertos, encontramos o Sergio organizando um concurso pra garotada apanhar as “minhas” tuviras nas descidas do
toboágua; as coitadas de tão assustadas que estavam quase se suicidavam com aquela quantidade de garotos tentando captura-las na descida.
Ah! e você dividiu os grupos de competidores por idade e sexo.
Nas confraternizações a que você se refere, foram memoráveis churrascos que organizávamos quase que mensalmente, e invariavelmente o lugar
escolhido era a chácara do querido amigo Fiori, onde os professores novatos pagavam um barril de chope, tinham uma finalidade a mais do que a
reunião de colegas de trabalho. Ali nós professores mais velhos, apresentávamos o novo ou a nova colega a todo o grupo e aos nossos familiares.
Meus três filhos, desde pequenos, conheceram meus colegas de trabalho, foram alunos deles, e até hoje ainda chamam alguns deles de tio.
É companheiro, acho que prestamos um bom trabalho de relações públicas.
Um grande abraço
Marcão